Em virtude da
elevação da natureza humana, de sua queda e de sua reelevação a esta mesma
ordem sobrenatural, é irreal considerar o homem em sua situação existencial,
limitando-nos ao aspecto puramente natural e abstraindo-se, em nossas
considerações, do fato primordial da Cruz.
Como os
efeitos do Calvário não se limitam aos acontecimentos transcorridos depois da
morte de Cristo, mas penetram todo o histórico, podemos dizer que mesmo em
Adão, a partir do momento em que o Messias é prometido, o estado existencial do
homem é um estado de ser-Remido.
As existências
de todos os homens, mesmo daqueles que recusam a própria reincorporação em
Cristo e daqueles que escolhem sua exclusão do Corpo Místico, deve ser
considerada em relação ao próprio Cristo. Porque no Calvário, todos os homens
são chamados a participarem deste Sacrifício; a aceitação deste chamado torna o
homem membro de Cristo, a sua recusa o exclui do Corpo Místico, relacionando-o
negativamente a Cristo.
Pela
Encarnação, toda a natureza humana é elevada ao sobrenatural; pela Redenção,
toda a natureza humana é remida e o estado sobrenatural é reconquistado para
todos os homens. Assim. A recusa de determinado indivíduo em aceitar a Redenção
é contra a economia salvífica e, portanto, pecado contra Cristo.
Assim aqueles
homens que não são contados entre os membros do Corpo Místico, devem ser
considerados não como indivíduos em puro estado natural, mas como indivíduos a
quem a re-elevação ao sobrenatural foi oferecida, mas ou recusaram-na ou a
rejeitaram depois de a terem aceitado, escolhendo existirem separados do Corpo
Místico, o que significa existir responsável pela perda da elevação
sobrenatural e da própria não-participação na Graça de Cristo.
Os que
recusam o batismo são elevados negativamente ao sobrenatural; os que existem
fora do Corpo Místico, estão de maneira negativa relacionados a Cristo. Porque
Cristo ao conquistar o pecado e a morte traz a salvação aos homens, que não a
podem ignorar, ou aceitam-na ou recusam-na; tornando-se seus irmãos ou seus
inimigos.
Em
conseqüência temos que ao agir, o homem age através da natureza elevada ao
sobrenatural, tornando seus atos, positiva ou negativamente sobrenaturais. Um
ato de virtude, praticado no seio do
Corpo Místico tem conseqüências positivas na ordem sobrenatural, contribuindo
para a santificação de quem o praticou e para a santificação de todo o Corpo
Místico; o pecado, sempre traz conseqüências negativas, quer para o individuo,
afastando-o de Cristo, quer para o próprio Corpo Místico, impedindo a livre
circulação da Graça de Cristo. Os atos cometidos por aqueles excluídos do Corpo
Místico, sempre produzem efeitos negativos em relação a sua própria pessoa,
embora não cremos que tenham conseqüências nefastas no Corpo Místico, pelo
simples fato de serem cometidos por quem não lhe pertencem.
Ao falarmos
acerca de pessoas excluídas do Corpo Místico, referimo-nos apenas aquelas
pessoas que não aceitam sua própria incorporação no Corpo Místico ou que
escolhem sua definitiva exclusão do mesmo, não nos referimos aqueles que
através do pecado tornam-se membros mortos, pois estes permanecem sendo membros
de Cristo, uma vez que podem ser ressuscitados para Cristo, através da Graça e
dos Sacramentos.
É na
participação na existência de Cristo que percebemos a distinção entre as ordens
naturais e sobrenaturais. Caso o homem não tivesse sido elevado ao
sobrenatural, continuaria por sua natureza a praticar os mesmos atos, de que é
capaz em sua existência pessoal, mas esses atos permaneceriam estritamente
limitados a esfera espácio-temporal e o homem não seria capa de participação na
existência de Cristo.
A
participação na existência de outro ser, no nível puramente natural, ou
limitar-se-ia a participação no acidental, ou traria como conseqüência a
destruição da identidade individual e, portanto a destruição do próprio ser,
enquanto ser distinto do ser em que participa. A elevação a ordem sobrenatural,
embora permitindo o homem participar na existência divina, deixa intacta sua
identidade pessoal, porque sua natureza não é modificada e nem absorvida pela
natureza divina.
É o contato
pessoal, entre Deus e os homens que caracteriza a união mística. Sem a união
mística o homem continuaria a ser sustentado na existência por Deus, mas suas
relações permaneceriam no nível de relações entre criaturas e Criador e não no
nível de relações pessoais, que são essencialmente relações entre amigos,
Apenas o Ser
necessário possui o ser em toda a sua plenitude e perfeição, por encontrar em
si a razão e a causa de seu próprio ser, o ser contingente, encontrando seus
fundamentos no Ser necessário, é reduzido a ser de participação e, portanto,
contendo em si limitações que caracterizam a finitude de suas perfeições.
Perfeições que se constituem em pálidos reflexos das perfeições do Ser
necessário.
A Criação, colocando os seres
contingentes na existência, os torna participantes no Ser; a elevação ao
sobrenatural, propicia ao homem participar na própria existência da divindade.
O participar na Existência, não confunde as existências dos homens com aquela
de Deus, pois Deus possuindo a existência divina em-si, a possui em toda a sua
plenitude e perfeição, enquanto que os homens participam desta mesma existência
divina, participam na existência que não é sua própria e, portanto participam
da existência divina, não em plenitude, mas limitada e imperfeitamente. Aliás,
a própria noção de participação compreende noções de limitação e
imperfeição.
Assim, como
os seres participam do Ser, participam de diferentes modos e com diferentes
intensidades, assim também, os homens ao participarem da Existência divina,
participam de diferentes modos e com diferentes intensidades. Diverso é o modo
de participação de quem se encontra unido ao Corpo Místico através do batismo
sacramental ou do batismo de desejo, de quem é confirmado, de quem recebeu o
caráter sacerdotal, etc.
A intensidade
na participação, entretanto, não está necessariamente relacionada aos modos de
participação. Depende da maior intimidade existente entre o indivíduo e o
Criador, intimidade que é característica da maior ou menor perfeição alcançada
no caminho em busca da santidade.
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